Côte de Beaume é o reino dos brancos. Se a Côte de Nuits, ao norte, é ideal para os tintos, a Côte de Beaune, ao sul, é terra de brancos. Acima de Beaune, temos nomes como Pernand–Vergelesses, Ladoix– Serrigny, Aloxe–Corton, Savigny–Lès–Beaune e Chorey–Lès–Beaune. As três primeiras comunas citadas participam com vinhedos na produção de um único grand cru tinto da Côte de Beaune, o Corton. Estes, geralmente se mostram de boa guarda, bem estruturados, equilibrados e com longo final de boca. Também é nelas que estão os vinhedos que originam um dos melhores vinhos brancos do mundo, o Corton– Charlemagne, cujo nome homenageia o imperador que unificou a França. Trata-se de um grand cru que, com o tempo em garrafa, adquire cor marcadamente ouro, de excepcional qualidade aromática, encorpado, e com um final capaz de trazer recordações por muito tempo. Longevo, recomenda-se deixá-lo bons anos repousando na garrafa antes de degustá-lo.
Abaixo de Beaune, temos Pommard (tintos intensos e robustos), Volnay (tintos suaves e redondos), as comunas pouco conhecidas de Monthélie, St-Romain, Auxey-Duresses e St.Aubin, e as três aldeias (comunas) de ouro quando se fala em vinhos brancos: Meursault, Puligny–Montrachet e Chassagne–Montrachet, englobando o que se chama de Côte de Meursault. Por último, Santenay (tintos levemente encorpados) e Maranges, que reúne três cidades.
Meursault oferece excelentes opções enogastronômicas, além de boas alternativas de visitas a produtores. Lá também se encontra um pequeno hotel/restaurante (o L’Hotel de Ville, na praça de mesmo nome), que nos proporcionou um daqueles momentos mágicos da viagem, com o seu prato tradicional, servido desde 1872 – Terrine chaude de la mère Daugier. Outra boa surpresa foi o vinho que acompanhou o estouffade de boeuf à la bouguignone, de muito boa relação preço-prazer: o Meursault Les Cras 1er Cru 2002, um raro tinto num terroir dominado por brancos, do bom produtor Jean Latour–Labille et Fils, que refletiu a excelente safra de 2002 para tintos e brancos da Borgonha.
Muita fruta vermelha ao nariz, com toques de couro, elegante, equilibrado e com um longo final de boca. Ainda na praça (ao lado do restaurante) uma boa dica de compra de vinhos é a Cave des Vieilles Vignes. Não há como não deixar de aproveitar e trazer alguns grandes vinhos com preços de produtores. Já que na Borgonha o perigo está no nome do produtor, a escolha recaiu sobre Vincent Girardin, pouco conhecido entre nós, mas de grande qualidade.
Antes ou depois do almoço, é obrigatória uma visita ao vinhedo Le Montrachet, que povoa os sonhos de todo amante do vinho.
As numerosas estrelas da brilhante constelação Montrachet
Para um enófilo, não há como deixar de experienciar certa ansiedade — diga-se de passagem gostosa — ao se aproximar de Le Montrachet, que pertence em parte à comuna de Chassagne Montrachet e em parte à de Puligny-Montrachet. São apenas oito hectares e 15 produtores, cujas garrafas, de safras mais recentes, custam em média, lá mesmo, 250 euros. Os vinhos de produtores mais famosos, principalmente em grandes safras, custam bem mais. É imprescindível ficar atento ao nome do produtor para não comprar gato por lebre: o vinhedo é fantástico, mas a qualidade dos vinhos que produz não é uniforme. Nas mãos de um bom produtor, o Le Montrachet é capaz de combinar concentração, potência e elegância, como nenhum outro vinho branco do planeta. Mas é preciso ter paciência para degustá-lo, e aos outros grandes vinhos brancos desta região. Tomar um Le Montrachet com quatro ou cinco anos, por exemplo, é pecado mortal, sem direito a penitência. Para mostrar todo o seu potencial, ele exige pelo menos 12 a 15 anos de guarda. Estão divinos, para serem apreciados agora, os vinhos das safras 1990, 1992, 1995 e 1996. Não se apresse, porque eles ainda têm muitos anos pela frente.
Nas vizinhanças, localizam-se outros grands crus ilustres, que também fazem parte da brilhante constelação Montrachet. São eles: Chevalier-Montrachet (vinhos extremamente elegantes), Bâtard-Montrachet (vinhos mais musculosos), Bienvenues-Bâtard-Montrachet e Criots-Bâtard-Montrachet. Mas lembre-se da recomendação feita anteriormente: é fundamental conhecer o nome do produtor, para não lamentar o valor gasto num vinho que poderá não justificar a fama e seu alto preço.
Para terminar esse roteiro em alto astral, nada melhor do que uma refeição no ótimo restaurante Le Chassagne, em Chassagne-Montrachet, que tem uma das melhores cartas de vinhos da região. E o que é ainda melhor, a preços razoáveis. Bon voyage!